Esperando Godot



Quando a ordem legal se transforma em obstáculo para maior eficiência e qualidade no atendimento ao cidadão levanta-se a hipótese de reformas do aparelho do Estado. O que parece obvio. Todavia é preciso considerar, que mudanças na cultura administrativa não seriam suficientes para que certas contradições deixassem de existir na política brasileira. Refiro-me ao sistema legal vigente, cuja origem remonta a Proclamação da Republica.

Aclamado brasileiro do século, Ruy Barbosa foi o grande organizador da Republica, além de autor da Constituição da Primeira Republica e primeiro Ministro da Fazenda. No entanto pesa contra o baluarte das ciências jurídicas do Brasil a exclusão da Constituição o direito a educação básica garantido no período imperial. (exceto para escravos)

Portanto, o senhor Barbosa, coloca-nos diante da questão, se o expoente fundador da Republica foi capaz daquilo, o que esperar disso, as reformas em curso no Brasil?

Consolidando-se a cada novo decreto, emenda, lei etc um outro regime, a juristocracia. Método formidável da escola de intimidação de onde surgem os grandes especialistas na judicialização da vida (dos outros). Para que aqueles que ficassem de fora pudessem se ajustar a especialidade da qual um dia zombaram.

Explico. Com desemprego em alta, concursos públicos e vestibulares conformam antigos críticos aos objetivos e exigências da burocracia dominante. São teses e teses a justificar tais contradições. Logo, procurar alguma ideia justa neste contexto é perda de tempo. 

Entretanto, sem nenhum julgamento prévio é preciso clareza sobre qual a orientação do Aparelho do Estado. Ter prioritário o próprio Estado ou a sociedade em geral. A falta de dinamismo, estruturas obsoletas, caras e centralizadoras revelam uma administração não permeável a mudanças. Ainda que aglutinando considerável massa pensante tentativas foram inócuas ou redundantes e concluídas com palavras desanimadoras: Fizemos o possível, porém que ainda há muito que fazer”

Inegável, que a história registrasse tentativas embasadas, diagnósticos bem elaborados, porém, sem que se evitasse a manutenção dessas estruturas. Simplesmente, porque os critérios adotados são anti-republicanos, pretexto para deformação do Estado em suas responsabilidades fundamentais. A cada tentativa de reforma isso fica evidente. Aumentando-se tensão em processos de maior racionalização no topo da cadeia de arrecadação, controle e fiscalização, sem representar melhoria nos serviços, ou pelo menos na distribuição equânime da arrecadação de impostos entre classes.

Segundo dados do IPEA, 71,28% dos impostos, taxas e contribuições arrecadadas no país derivam das camadas mais pobres e assalariados. 

Podemos inferir, que além da má distribuição dos impostos, jamais revertidos para o bem comum, em Saúde, Educação, Moradia, Transporte, etc, excluem do rol de contribuintes, aqueles que mais deveriam contribuir, confirmando a tese, que no labirinto jurídico no qual impera o ativismo a favor dos Direitos Humanos, domina a lógica diabólica que movimenta as engrenagens do progresso social no sentido inverso em beneficio de poucos.

Desde Rui Barbosa o jogo foi levado por gente graúda, mas ao longo do tempo foi sendo substituída por gente de estomago forte. Para dizer o minimo. Eduardo Cunha. Então em intervalos cada vez mais curtos a sociedade é requisitada. O sacrifício aguarda. Para que tudo permaneça como sempre esteve, desigual.

Essa forma de ativismo processual impõe desconcertantes experiências jurídicas, além de tensão extra a nossa guerra civil crônica. Assim, a população se mantém mobilizada para a próxima catástrofe inevitável, enunciando ao final: “Que quem sobreviver viverá o progresso”. Sem opção aderimos.

Principalmente os mais jovens, os futuros especialistas da justiça, ordem e progresso! Mas enquanto o progresso não chega, convivemos ordeiramente no matadouro que o país se transformou, antes de adoecerem, Esperando Godot.

Falta-lhes, no entanto, alguma coisa que a extrema regulação do abandono social os impede de ver, hipnotizados pela tecnologia e ambição cega. Neste cenário, o passado será esquecido, inclusive o progresso. Aquele que enuncia hoje, deixará de existir amanhã. Por isso a guerra parece não ter fim.

A febre legalista nascida na Primeira Republica continua silenciando e ameaçando a dignidade das pessoas, cuja esquizofrenia política dos novos brasileiros insiste em declarar irreal na letra fria da lei.

América salve Deus.

Claudemir Sereno


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