Diretas Já, Abertura Já, Impeachment Já, Eleições Já. A urgência a serviço da corrupção.








Algumas coisas não perdem valor, por exemplo, os clássicos da literatura universal. Por tratarem de temas que podem ser entendidos por leitores de diversas idades, em diferentes épocas, como amor, ódio e morte, expressões de verdade, beleza e amor. 

Para que os grandes mestres escapem do abismo do tempo oferecem ao leitor a originalidade de um ponto de vista sobre a vida. Talvez esteja aí a receita ou método interessante para dar conta do ambiente caótico que nos deparamos nos períodos de crises econômicas e políticas, pautados pelos veículos de comunicação de massa. 

Ao atingirmos certa estabilidade emocional, podemos nos confrontar criticamente com as repetições sistemáticas que nada mais buscam do que conformidade da população. A emergência da expressão, "JÁ" revela o momento da crise moral do Estado no qual a economia, a politica e a justiça juntas ficam despidas, resultado do descalabro provocado pela corrupção. Senha para violência oficial.

Por isso me arrisco, sei do que se trata ao observar a revolta dos jovens pelo mundo. Primaveras, manifestações, lutas de guerrilha aqui e acolá. 

Infelizmente, esperar que a podridão que cercava o Reino da Dinamarca em Hamlet, fosse singelamente descartada da realidade representaria a tolice. Por outro lado, observa-la tão vinculada a elite política, assumindo status, exuberância e empoderamento, 'já' é demais. 

Enquanto Shakespeare foi generoso e justiça feita no mundo das pessoas reais longe da Dinamarca, na terra de Lalau, Rocha Matos e Sérgio Moro, jovens, desvairados Hamlet's continuam a busca por justiça enfrentando o poder, nas ruas à porta dos Palácios.

Apesar da suposta lucidez política, 70 mil novos homicídios serão praticados neste ano. As vítimas, em sua maioria Hamlet's...

Se pudesse objetivamente traduzir a insatisfação dos jovens diria que juntos, representam a mais pura verdade, embora individualmente desconheçam o objeto da angustiante causa, a pressentem nas terríveis estatísticas. 

Para entender a gênese de tais injustiças, implicaria dizer que de tão explicitas quanto cruéis, adquiriram vida própria fundando um mundo à parte com jurisprudência própria e foro privilegiado. É difícil identificar o obvio!

Portanto mesmo que as manifestações sejam conduzidas pacificamente, o confronto se tornará inevitável pela imensa dificuldade que o poder - que segundo juristas, emana do povo - tem em reconhecer no rol das atribuições, algo mais importantes do que o surrado discurso da manutenção da ordem publica. 

Assim a violência virá como resposta ao dialogo impossível sobre justiça social, incompatíveis aos ritos do poder injusto. Daí, o confronto. Foi assim com os excluídos na época da ditadura, com professores na 'democracia' recente. Hoje, não seria diferente com os jovens.

Ou seja, a resposta para inquietação das ruas, será o aparato policial e seus excessos. Embora as cenas de violência se repitam por todos os lados, será preciso analisa-las a medida que nada justificam, exceto a própria violência.

Logo, o estandarte disseminador de terror pela sociedade, talvez se justifique por encobrir o comportamento facínora da elite corrupta, da mesma maneira que na Síria de Assad, na Libia de Muammar al-Kadafi ou no Egito de Hosni Mubarak, entre outros.

Ainda que na obra Shakespeare não sugira um final sem vingança, ainda que o fantasma do pai exija que o filho o vingue. Hamlet´s, mundo afora, não conseguem concentrar forças suficientes para prostrar rei Claudio. Então, fica configurada uma luta sem fim, por respeito à identidade, a tradição e a justiça. 

Hamlet's, de ontem e de hoje.

Aparentemente estivemos alheios a nossa condição até os recentes protestos, entretanto em 1979, durante a ditadura militar, no inicio do governo biônico de Paulo Maluf, os confrontos na Cidade de São Paulo também se intensificaram. 

Eram tempos de chumbo, que não se foram por decreto! Exigiram sacrifícios de todos, por isso saímos as ruas. Engrossamos ao enfrentar a policia do então Secretário de Segurança Erasmo Dias. A semelhança aos dias atuais não seria mera coincidência, quero destacar que vivemos um processo de violência deliberada.

Assim, da mesma maneira naquele período, muitas pessoas tiveram suas vidas ceifadas como se fossem criminosos comuns. 

Fichadas como tal, segundo as mesmas fontes que tratam hoje, Hamlet's como terroristas. Sob idêntico ponto de vista, havia a política contaminada pelo terror, patrocinadas pelo interventor que diante do conturbado ambiente tentava viabilizar a mudança da Capital do Estado de São Paulo para o Vale do Ribeira. A nova capital foi apelidada de cidade Frankenstein e, nunca saiu do papel. 

Em 1979, eu era office-boy, tinha 16 anos, aderira ao movimento liderado pelo Sindicato dos Bancários no centro de São Paulo, Luiz Gushiken à época com 25. Enquanto o povo pedia respeito, o sindicalismo pedia direitos. Eis o equivoco!

Naquele dia, após uma série de confrontos com policiais da Cavalaria e do Choque -- em meio a tiros, porrada e bomba, fumaça e gente ferida, - ao fim da tarde retornei para o local de trabalho. 

De lá podia avistar a fumaça entre os edifícios do Banespa, Martinelli e Banco Brasil nas imediações da Rua XV de Novembro e, ouvir estampidos de tiros, estopim das bombas lançadas no Largo São Bento. 

Quando tudo apontava para uma luta particular sem remissão, levada por baderneiros e terroristas, sinônimos de Black Block, ocorreu-me na solidão, diante do emaranhado de prédios, uma nova forma de luta que manteve a memória ativa, iluminando como facho luz minha singela ação politica e acima, uma nova maneira de ser no mundo. Ser, ou não ser, eis a questão.

Portanto, nascia na solidão, a poesia, fruto da indignação e coragem, percorrendo o tempo, de Shakespeare a Frankenstein, para hoje dar conta da verdade: 

FRANKENSTEIN

Poesia de Claudemir Sereno, São Paulo, 1979.

Vejo em ti,

Óh selva de edifícios

Um mundo que comete

Muitos malefícios,

Mas, que sacia

A fome de muitos,

E, mata outros,

Como se fosse

Um monstro,

Que chama,

Que suga,

Que mata,

E cativa

Criando laços

E, nos prendendo,

Em teu solo, o asfalto

Em tua água, o mercúrio

Em teu ar, a fumaça

E, em teus ignorantes,

Os governantes,

Que como, Dr. Frankenstein

Criaram um monstro

E, não sabem o que têm

E não melhoram,

Apenas, pioram

Pensando que somos mutantes,

Para aguentar, 

Agonizantes

Até, a hora de ignorar,

Os ignorantes.


Os confrontos duraram um bom tempo, sem que fossem noticiados. As equipes de reportagem ficavam próximas, no viaduto do Chá, observando. 

Este processo foi alicerce para as ‘Diretas Já’, também desencadeou o inicio dos Movimentos Sociais, com apogeu na década de 80, nada mais do que respostas desencontradas para problemas de natureza distinta... inaugurando o equivoco e o mal entendido do qual somos vitimas hoje.

'Não havia caras pintadas', mas exclusivamente gente excluída: pretos e brancos pobres, sobretudo HOMENS que exercitavam a liberdade diante do horror.

Claudemir Sereno

































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